Em 1998, Heloisa mexeu a cadeira pela primeira vez. E naquele ano, foram reiterados movimentos no ritmo de uma batida que virou hit ao som de Vinny. Não negue. Você lembra e ainda dançou sob seus versos. Uma canção fugaz, mas com métrica, refrão chiclete, batida padrão anos 90 que conectou com aquilo que as pessoas à época desejavam ouvir. O debate público e político-eleitoral também tem mexido (e atirado) cadeiras contra si mesmo ao tentar copiar, mimetizar comportamentos que engajam nas redes e trazê-los para o mundo real.
Um discurso caricato sobre lançar 50 mil foguetes e ter seu cérebro implantado em robôs chineses para compartilhar seu conhecimento com o mundo alçou um personagem da internet à disputa da maior capital da América Latina, São Paulo. O modus operandi foi adaptado à campanha e as promessas passaram a teleféricos contra o trânsito, provocação e agressão verbal aos adversários ao ponto de gerar uma agressão física. O episódio entre o coach Pablo Marçal e o apresentador José Luiz Datena no debate da TV Cultura deveria servir de marco para uma mudança radical na forma como se faz comunicação política no Brasil.
Digo isso porque, em menores decibéis, as campanhas eleitorais por todo o território nacional seguem com uma retórica violenta ou desinformativa. Ou vai dizer que é normal um candidato à Prefeitura do Natal questionar o uso do fundo eleitoral por outra candidata – sendo que também faz uso – e afirmar que aquele recurso destinado exclusivamente à realização da campanha poderia construir casas? Até poderia, se a lei permitisse. Mas não é o caso. Tivemos ainda, também por Natal, a proposta folclórica em 2004 da ponte “Natal-Noronha”. Há ainda aqueles que prometem acabar com o “comunismo” que nunca existiu.
Parte desses comportamentos servem apenas aos cortes para redes sociais, mas contribuem para degradação da atividade político-partidária. Marginaliza-se o debate para questões acessórias. O foco é o espetáculo, a performance, o que demanda e prende a atenção por mais tempo. A cadeira que mexe e que vai para o canto da sala é o bem-comum, aquilo que importa e acaba atirado sem qualquer pudor, ainda que derive para violência política.
É a diluição de algo fundamental enquanto valor humano, um instrumento que nasce para promover a construção de consensos e resolução de problemas nas cidades, nas sociedades. E longe de mim dizer que o conflito não faça parte da política, posto que o atrito, a fricção social da discordância é o que gera o produto positivo da política. Mas enquanto partidos e parte dos políticos não alcançarem a consciência da importância de seus papeis, vale o que cantava Vinny: “Mexe a cadeira. Sabe tudo e nada fala. Mexe a cadeira e perde a vergonha na cara.”
Bruno Araújo é jornalista, escritor e especialista em Comunicação Pública
