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Economia

Arrecadação com multas mais que dobra em Natal; especialista cobra política efetiva de segurança viária

Dado é do Portal da Transparência da Prefeitura de Natal e referente ao mês de janeiro deste ano em comparação com o primeiro mês do ano passado
Douglas Lemos
07/03/2024 | 10:52

No mês de janeiro deste ano, a Prefeitura de Natal registrou uma arrecadação mais de duas vezes maior (+118%) maior com multas de trânsito. Dados do Portal da Transparência apontam que o total arrecadado foi de R$ 8,3 milhões, aumento substancial quando comparado com os R$ 3,8 milhões do ano anterior. Para um especialista em estudos urbanos e regionais, a capital potiguar enfrenta problemas e ainda não detém uma política efetiva de segurança viária.

Morador de Natal, o consultor automotivo Fernando Pires costuma rodar até dois mil quilômetros por mês no Rio Grande do Norte e também em estados vizinhos. Com a alta quilometragem enfrentada todos os dias, ele relata se sentir exposto à infrações, mas conta que costuma receber poucas multas. Em janeiro, entretanto, foi notificado por três infrações. Mesmo assim, rechaça a possibilidade da formação de uma indústria de multas na capital potiguar. “Particularmente, eu nunca levei muito a sério essa questão de indústria de multas. E eu digo o porquê: eu, seguramente, passo mais de um ano sem levar uma multa. Rodo muito e raramente sofro multas”, afirmou.

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Segurança viária no trânsito de Natal ainda precisa evoluir e cidade enfrenta problemas de mobilidade, diz especialista - Foto: JOSÉ ALDENIR / AGORA RN

De acordo com Douglas Araújo, doutor em Estudos Urbanos e Regionais e professor da Universidade Potiguar (UnP), a análise do aumento na arrecadação de multas não deve ser considerada apenas com base no aspecto financeiro, mas também na efetividade das medidas adotadas para um trânsito mais seguro. “É fundamental que a fiscalização esteja integrada a uma política sólida de segurança viária, visando a proteção e bem-estar de todos os usuários das vias públicas”, disse.

Por estar com frequência no trânsito, Pires também relatou observar constantes infrações nas ruas de Natal, mas não sentiu impressão de que houve aumento na fiscalização. “O trânsito continua caótico. As motos continuam circulando em calçadas. Não observo diminuição de infração de motos e carros”, afirmou.

Outro ponto apresentado pelo motorista, foi em relação à presença de agentes da Secretaria de Mobilidade Urbana de Natal (STTU) com frequência, mas nem sempre trabalhando a favor da fluidez do trânsito. Nesta segunda-feira 4, Pires observou agentes de trânsito em cruzamentos de grande fluxo, na Avenida Senador Salgado Filho, uma das principais da cidade. “Observei isso nos cruzamentos da Salgado Filho com Nascimento de Castro, Antônio Basílio, Nevaldo Rocha e Alexandrino de Alencar. Quatro semáforos seguidos. Em todos os semáforos, [cruzamentos] obstruídos. Por volta de 19h, todos tinham pelo menos dois agentes de trânsito nos cruzamentos. Nenhum orientando o trânsito ou minimamente atento. Em todos estes semáforos tem sinalização no asfalto para não obstruir”, observou.

Segundo o motorista, também era possível observar outras infrações, como o uso de faixas exclusivas utilizadas por veículos de passeio. De acordo com Araújo, promover uma cultura de respeito às leis de trânsito requer esforços contínuos e colaborativos de vários setores da sociedade. Para ele, isso deve incluir também o ambiente escolar nas campanhas educativas e preventivas de acidentes de trânsito. “A mídia e outros meios de comunicação, como as próprias redes sociais, constituem ‘locus’ privilegiado para a difusão de uma cultura de respeito às leis de trânsito. Quando a preocupação está centrada na prevenção dos danos, assim como os gastos decorrentes desses acidentes, podem ser reduzidos consideravelmente”, defendeu.

Questionada pela reportagem, a STTU não se manifestou a respeito do aumento na arrecadação das multas de trânsito, nem quais os tipos de infração que contribuíram para o aumento no valor arrecadado em janeiro. A Pasta responsável pela mobilidade urbana em Natal também não respondeu se houve mudanças na fiscalização de trânsito ou nas políticas de aplicação de multas.

Outro questionamento realizado pela reportagem é o destino dos recursos arrecadados com as multas de trânsito pela Prefeitura de Natal. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) determina que a receita arrecadada com a cobrança de multas é distribuída para sinalização, fiscalização e engenharia de tráfego e de campo; aparelhamento e manutenção do policiamento de trânsito; e educação de trânsito. A STTU também foi questionada se esta verba seria destinada a melhorias na infraestrutura viária e segurança no trânsito, mas também não respondeu.

Natal enfrenta desafios quanto à segurança viária, afirma especialista

Ainda conforme Douglas Araújo, assim como outras grandes cidades, também enfrenta necessidade de melhora em pontos específicos. “Fatores como o volume de tráfego, infraestrutura das estradas, educação no trânsito e fiscalização são pontos de atenção que podem ser melhorados”, explicou.

Entre os destaques positivos, está o índice de mortes no trânsito. Araújo afirma que houve redução de 100% de mortes no trânsito causadas por motoristas alcoolizados em 2023. “Segundo dados do Comando de Policiamento Rodoviário Estadual (CPRE), o número de mortes causadas por motoristas alcoolizados diminuiu 100% em Natal durante o ano de 2023. A última morte registrada, decorrente de acidente que envolveu motorista sob o efeito de álcool, aconteceu no dia 18 de dezembro de 2022, no bairro de Cidade da Esperança”, esclareceu. A explicação, conforme afirmou o especialista, seria com base no aumento da fiscalização por meio das blitze da Lei Seca.

No entanto, Araújo afirma que dados do Comando de Policiamento Rodoviário Estadual (CPRE) da Polícia Militar apontam crescimento do número de acidentes de trânsito na Grande Natal durante o primeiro quadrimestre de 2023, em comparação ao mesmo período do ano anterior. “O número total de acidentes registrados em toda a Grande Natal, que engloba quinze municípios, passou de 748 em 2022 para 829 em 2023, representando um acréscimo de aproximadamente 11% nos acidentes. Os dados ainda não possibilitam afirmar que a cidade detém uma política efetiva de segurança viária”, explanou.

Como soluções para diminuição efetiva da letalidade e também de acidentes de trânsito, o professor apontou algumas medidas que podem ser implementadas pelo poder público para minimizar a ocorrência e a gravidade de acidentes na capital potiguar. “investimentos em projetos de engenharia viária para melhorar as vias urbanas, a sinalização, sobretudo nos cruzamentos; promover campanhas educativas para os motoristas, pedestres e ciclistas com pautas que envolvam a educação no trânsito; reforçar a fiscalização, especialmente nos lugares em que esse tipo de acidente é mais recorrente, implantando radares de controle de velocidade, fiscais de tráfego”, são algumas das questões sugeridas pelo especialista.

Para ele, fatores como melhora no transporte público urbano, com passagens em valores acessíveis, ampliar faixas de isenção e integração entre os vários meios de transporte; implementação de soluções de mobilidade inteligente, como semáforos adaptativos e sistemas de navegação e geolocalização, além da importância do envolvimento da comunidade local no debate, com palestras, blitze educativas, campanhas de promoção da segurança viária em geral são outros fatores que podem colaborar para um trânsito mais seguro.