A erosão acentuada do Morro do Careca, um dos principais cartões postais de Natal, causa riscos a turistas e potiguares frequentadores da praia de Ponta Negra, na Zona Sul. Ao longo dos últimos anos, a duna tem dado espaço para uma falésia, o que aumenta a probabilidade de deslizamentos. No dia 4 de março, a Prefeitura do Natal realizou uma vistoria na área do Morro, para identificar as causas do processo erosivo. A equipe de técnicos da Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb) e Defesa Civil percorreu parte lindeira à praia até o limite da área militar, com o objetivo de complementar as informações colhidas na primeira visita ocorrida no dia 6 de fevereiro.
O técnico da Semurb e pós-doutor em Geografia pela UFRN, José Petronilo da Silva Júnior, é responsável pela produção de relatório técnico sobre o caso. Conforme o relatório, blocos com volume que ultrapassam 2m³ se desprenderam da estrutura em março. “Diante do risco iminente, a celeridade erosiva sugere-se uma avaliação pormenorizada da estrutura geológica da área. Considerando que o cargo de geólogo inexiste na Semurb, bem como considerando a área se tratar de patrimônio da união, pois pertence ao Centro de Lançamento de Foguetes Barreira do Inferno (CLBI), entendemos, a princípio, como importante a provocação da Defesa Civil Nacional para que a mesma tome conhecimento da problemática ora em processo, bem como viabilize uma ampla avaliação sobre os possíveis riscos aos transeuntes da Praia de Ponta Negra, bem como atue com providências cabíveis para a salvaguarda dos cidadãos”, diz o relatório.
Segundo o pesquisador e professor de geografia na UFRN, Rodrigo de Freitas, se nada for feito, daqui a 10 anos 30% do morro pode deixar de existir. De acordo com ele, o Morro do Careca é muito importante para a cidade desde o ponto de vista geográfico, geológico, biológico, cultural e econômico. “O Morro do Careca é um dos principais símbolos visuais de Natal e do Rio Grande do Norte. Se a gente não cuida dessa identidade a gente tá matando uma parte cultural, e também o aspecto econômico. Pois em função de ter uma identidade forte, as pessoas vêm de longe para ver, tem uma importância econômica muito grande. Se o Morro acabar a gente vai matar uma parte da identidade de Natal e também da economia”, informou.
Audiência na Assembleia Legislativa sugere ações cooperativas
A Assembleia Legislativa realizou audiência pública no último dia 21 para discutir o tema “Morro do Careca e os processos erosivos nas praias turísticas do Rio Grande do Norte”. Proposto pelo deputado Neilton Diógenes (PL), o debate objetivou alcançar soluções práticas e imediatas de combate à degradação do meio ambiente potiguar. “O nosso Rio Grande do Norte enfrenta hoje um problema que está se agravando e traz uma implicação direta no meio ambiente, no Turismo e na Economia. As erosões no nosso litoral atingem hoje mais de 30 praias, em 13 cidades distintas, do litoral Norte ao Sul. O caso de maior notoriedade é o do Morro do Careca, principal cartão postal de Natal e do Estado como um todo. Mas, nesse lindo litoral potiguar de 400 quilômetros de costa, as erosões se multiplicam e ameaçam a fauna, a flora e diversos setores da nossa sociedade”, iniciou o propositor do debate.
O deputado Neilton destacou que as ameaças acontecem em diversas frentes, prejudicando o meio ambiente, a atividade turística e, consequentemente, a Economia de todo o Estado. “Com relação aos impactos ambientais, sabemos que as construções de grandes barragens nos rios fazem com que a areia não chegue aos oceanos. Da mesma forma, as construções em áreas de costa, como calçadões e muros de arrimo, intensificam o processo erosivo. Por fim, as mudanças climáticas, com a elevação do nível do mar, agregam mais complexidade a essa discussão ambiental. Do ponto de vista do Turismo, o litoral potiguar corre risco de sofrer grandes mudanças no seu cenário com a intensificação dessas erosões. E isso acaba gerando grandes impactos também na Economia, afinal, a atividade turística representa 15% do nosso Produto Interno Bruto”, detalhou.
Segundo o parlamentar, há uma exigência sobre os municípios costeiros para que reforcem as fiscalizações e a atuação da Defesa Civil nas encostas; e a respeito dos órgãos ambientais, é preciso dar maior celeridade aos processos, para que ações de intervenção e contenção das erosões possam ser feitas o quanto antes. O professor da UFRN Rodrigo de Freitas explicou que a erosão está se intensificando devido a três fatores: redução do aporte de sedimentos, ou seja, diminuição da quantidade de areia; uso desordenado do solo nas áreas de orla; mudanças climáticas e elevação do nível do mar.
De acordo com o Procurador da República Vítor Mariz, representante do Ministério Público Federal (MPF), o Morro do Careca é um bem da União, que foi tombado como monumento paisagístico cultural e integra uma Zona de Proteção Ambiental. “O Ministério Público começou a receber, nos últimos meses, denúncias e informações mais acentuadas a respeito da situação precária do morro. Mas essa luta pela defesa do Morro do Careca data de 1997. Nessa época, uma Ação Civil Pública foi instaurada na Justiça Federal, resultando na interdição total do morro; na garantia do policiamento ostensivo e da fiscalização, com placas informativas e cercas de isolamento; além do pedido de elaboração de um plano de recuperação e preservação da área”, contou.
O procurador disse ainda que no início deste ano o MPF instaurou Inquérito Civil a respeito do tema e coordenou reuniões com órgãos públicos, como Ministério Público do RN, Idema, Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal (Semurb), Polícia Militar do RN e Ibama; requisitou vistorias e relatórios ao Idema, Semurb e Defesa Civil; e provocou a Defesa Civil Nacional e o Comando da Aeronáutica, em torno do assunto. “Os relatórios evidenciaram um avançado processo erosivo, com perda acelerada de sedimentos; estrutura de fragilidade nas faces das falésias; risco de ruptura e movimento gravitacional de massa; e ainda um conjunto de fraturas e cortes, indicando áreas de ruptura e descontinuidade, com formação de lascas e fendas, além de cavidades nos sopés, o que indica um risco iminente de colapso, acarretando risco à vida e à integridade física das pessoas”, detalhou o procurador.
Solução
Para o secretário da Semurb, Thiago Mesquita, “o aterro hidráulico é a solução que nós temos”. A ‘engorda’ em Ponta Negra é necessária. A transformação será muito positiva do ponto de vista social e turístico, mas essa é uma intervenção necessária do ponto de vista ambiental. É preciso resistir a esse avanço natural e histórico. Toda essa situação nos preocupa muito”, frisou. O prefeito Álvaro Dias (Republicanos) também defende esse projeto.
O diretor-geral do Idema Leon Aguiar disse ainda que foi preciso solicitar autorização do IBAMA para dar continuidade ao processo de licenciamento de maneira local. “A partir de certo ponto do processo, nós tivemos a preocupação de entrar na seara do IBAMA sem autorização. Então, precisamos pedir essa autorização para que possamos continuar com a análise e posterior concessão da licença, mas ainda estamos aguardando uma resposta formal da instituição. Atualmente, nós continuamos com os nossos estudos, com uma equipe de 20 pessoas, porque queremos deixar o processo pronto. A análise do processo será concluída até, no máximo, semana que vem, mas já sabemos que vamos pedir alguns esclarecimentos técnicos, especialmente acerca dos impactos na fauna e nos aspectos socioeconômicos”, disse.