Enquanto grandes consumidores internacionais de camarão, como EUA, União Europeia e China, esta última a maior produtora mundial, competem para ver qual deles vai importar 1 milhão de toneladas este ano, no Rio Grande do Norte, que já foi o pioneiro e maior produtor brasileiro do crustáceo, o preço do quilo de camarão pago ao produtor não daria para comprar um quilo de tripa bovina.
Essa comparação está sempre na cabeça do presidente da Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), Itamar Rocha, quando ele vislumbra o potencial do RN para a exploração da carcinicultura marinha. Especialmente tendo em vista sua excepcional potencialidade em termos de áreas, infraestrutura, clima e posição geográfica em relação aos dois principais mercados importadores: EUA e UE.
“Um desperdício de doer o coração, quando você vê a crise econômica instalada e os empregos sem qualificação que o setor poderia estar oferecendo para tirar muita gente da miséria”, diz Itamar, que nos bons tempos figurava nas páginas de influentes veículos especializados em economia.
Nem a liderança da carcinicultura no Brasil o RN conseguiu manter, perdendo para o Ceará, que hoje, enfrentando os mesmos problemas de uma política nacional míope no que se refere ao segmento do camarão, produz quase o dobro do RN, e já possui mais de 1.000 produtores, contra 400 a 450 do RN.
No contexto mundial, cuja demanda de camarão marinho cultivado é crescente, mas vem sendo atendida fortemente por países como Índia e os pequenos, como Vietnã, que este ano vai exportar 760 mil toneladas e faturar algo ao redor de US$ 4 bilhões, não dá para aceitar o Brasil, que já foi líder mundial da produção em 2003, na rabeira de um negócio que fatura em torno de US$ 30 bilhões/ano.
Nessa entrevista ao Jornal Agora RN, Itamar Rocha fala dos problemas do setor em números e o que o RN perde com a queda da carcinicultura.
Agora RN: O que o RN perde com a queda da carcinicultura?
Itamar Rocha: Perde muito. Basta considerar que, em 2003, o camarão cultivado do Brasil foi líder mundial de produtividade e o setor ocupou o primeiro lugar nas importações de camarão pequeno e médios dos EUA. Para a União Europeia, com destaque para a França, onde o produto brasileiro participou com 28% e o RN com e 38 mil toneladas, tínhamos uma posição confortável. Infelizmente, isso ficou no passado.
Agora RN: Como está a situação hoje?
Itamar Rocha: Em 2020, o camarão cultivado do Brasil, praticamente ficou fora do mercado internacional, com apenas 80,3 toneladas / US$ 341 mil, comparado com 677.000 toneladas / US$ 3,6 bilhões de dólares exportadas do Equador, numa clara demonstração dos equívocos cometidos pela nossa política de produção e exportações de camarão, entre os anos de 2004/2020.
Agora RN: Como estão os valores pagos ao produtor hoje?
Itamar Rocha: Os preços pagos na fazenda ao camarão marinho cultivado do Brasil, pela cadeia de intermediação, são de R$ 12,00 a R$ 14.00 o quilo para o crustáceo de 10 gramas, aumentando R$ 1,00 por grama, o que significa que chegamos mais uma vez ao fundo poço, colocando em risco uma atividade tão importante para a socioeconomia primária brasileira.
Agora RN: O que falta para sairmos disso?
Itamar Rocha: Quando se analisa a conjuntura atual dos mercados, nacional e internacional, a conclusão é que estamos precisando de uma ferramenta que certamente é de difícil êxito, pois depende fundamentalmente de apoio governamental, no tocante ao Licenciamento Ambiental e Financiamentos Bancários, bem como, do entendimento e decisão do próprio setor, no sentido da união e redobrado esforço de mobilização, no encaminhamento dessas reivindicações.
Agora RN: O que é preciso?
Itamar Rocha: Precisamos urgentemente superar os entraves dos preços baixos e dar uma atenção especial à ampliação das oportunidades de vendas no mercado interno e, naturalmente, das exportações, retornando ao mercado internacional, o que passa, necessariamente, pelo aumento sustentável da produção e a captação de apoio financeiro para a industrialização, estoque de produtos acabados e exportações.
Agora RN: Só isso?
Itamar Rocha: Absolutamente. São indispensáveis ações de competitividade suficientemente sólidas para atrair investimentos estruturadores, financiamentos para os investidores privados e, especialmente, atrair e capacitar empresas âncoras, detentoras de tecnologias, para apoiarem a grande massa de micros e pequenos carcinicultores. Mais ainda, na exploração com sustentabilidade, das nossas vastas áreas disponíveis em todo o Rio Grande do Norte, Nordeste ou mesmo o Brasil, que apresenta condições de exploração e produção do camarão marinho Litopenaeus vannamei, em todas suas macros regiões.
Agora RN: Isso resolveria os problemas imediatos do setor?
Itamar Rocha: Pelo menos vai gerar oportunidades de negócios, produção, empregos, rendas e, estabelecer uma nova ordem econômica, com reais condições de proporcionar vida com dignidade no meio rural litorâneo e interiorano do Nordeste e do Brasil.