Um conflito entre duas leis instalou uma dúvida sobre o desfecho do caso que pode resultar na cassação da vereadora de Natal Brisa Bracchi (PT). A divergência pode abrir caminho para que a vereadora escape da cassação antes mesmo da votação final – que está marcada, neste momento, para quarta-feira 19.
O processo de cassação de um vereador é orientado pelo Regimento Interno da Câmara Municipal, que tem força de lei. No entanto, existe também uma norma federal, o Decreto-Lei nº 201/1967, que disciplina os processos de cassação de mandato em todo o País. As duas regras trazem pontos conflitantes.

Brisa foi notificada oficialmente do processo de cassação em 22 de agosto. Segundo o Regimento Interno da Câmara, o processo deve ser concluído em até 120 dias após essa data. Já de acordo com o Decreto-Lei 201, o processo tem de ser finalizado em até 90 dias. Se esse último prazo for levado em consideração, o processo precisa terminar até no máximo o dia 19 de novembro (nesta quarta-feira).
Além disso, há um conflito sobre prazos processuais. Enquanto o Regimento Interno da Câmara prevê que a vereadora seja comunicada de todos os atos com no mínimo 72 horas de antecedência, o Decreto-Lei 201 estabelece um prazo de 24 horas.
Brisa Bracchi foi notificada sobre a sessão de julgamento na última segunda-feira 17, às 13h27, por mensagem de WhatsApp. Inicialmente, a votação estava prevista para esta terça-feira 18 às 9h, mas o desembargador Cornélio Alves, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), suspendeu a sessão alegando que o prazo mínimo de notificação não foi cumprido – tanto o do Regimento Interno quanto o do Decreto-Lei 201.
Com isso, a sessão foi marcada para quarta-feira 19, a partir das 11h. Com isso, a Câmara atendeu ao que prevê o Decreto-Lei 201, mas pode abrir brecha para nova suspensão pelo Judiciário, considerando o Regimento Interno – que estabelece que a vereadora precisa ser comunicada com o mínimo de 72 horas de antecedência.
Faustino fala em “interpretação criativa” do Judiciário
Em coletiva de imprensa nesta terça-feira na Câmara Municipal, o vereador Matheus Faustino (União) – autor da denúncia contra Brisa – disse que haverá protestos de rua caso o Judiciário faça o que ele chamou de “interpretação criativa”, isto é, combinar regras das duas leis.
O parlamentar alertou para o risco de o desembargador Cornélio Alves exigir o prazo mínimo de 72 horas de convocação, mas prazo máximo de 90 dias para o processo – o que seria impossível de atingir e, portanto, encerraria o caso com o arquivamento da denúncia.
“Se ele (desembargador) vai levar em consideração só o prazo de 72 horas do regimento interno para convocação, mas os 90 dias do decreto para encerramento do processo, ele vai usar o regimento para salvar Brisa. A população precisa ficar atenta à interpretação que o Judiciário pode ter para salvar Brisa. Se for levar em consideração o decreto, tem que levar em consideração tudo o que está no decreto”, afirmou o parlamentar.
O autor da denúncia ressaltou que poderá haver mobilização de rua a depender da decisão final da Justiça. “Eu estou vendo burburinho de que isso vai terminar em pizza. Dentro de uma democracia, a última instancia não é o Judiciário, é a população. Se o Judiciário ousar fazer interpretação criativa de fazer uma manobra para beneficiar Brisa, aí vamos ver as ruas de Natal completamente lotadas com a população querendo reivindicar isso”, declarou.
Cassação de Brisa
Brisa Bracchi (PT), que está em seu 2º mandato como vereadora, é acusada de ter transformado um evento cultural bancado com emenda parlamentar em ato político-partidário. Ela destinou R$ 18 mil para o Rolé Vermelho, realizado em 9 de agosto, e dias antes do evento publicou vídeo nas redes sociais afirmando que o encontro seria oportunidade para que militantes de esquerda celebrassem a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Para que a vereadora seja cassada, são necessários os votos de 20 de 29 dos vereadores da Casa. Dois vereadores estão impedidos de votar: a própria Brisa e o vereador Matheus Faustino (União), que foi o autor da denúncia. Neste caso, foram convocados os suplentes Júlia Arruda (PCdoB) e Albert Dickson (União). Júlia recusou a convocação – com isso, foi chamado o 2º suplente, Carlos Silvestre (PT).