A Justiça do Rio Grande do Norte determinou a suspensão imediata do processo de terceirização da gestão das Unidades de Pronto Atendimento (UPA) de Natal. Com isso, ficam suspensos os editais de convocação pública lançados pela Prefeitura do Natal para contratar Organizações Sociais de Saúde (OSS) para administrar as quatro UPAs do município: Satélite, Esperança, Potengi e Pajuçara.
A decisão foi expedida nesta segunda-feira pelo juiz Francisco Seráphico da Nóbrega Coutinho, da 6ª Vara da Fazenda Pública de Natal, e atendeu a pedido feito em ação popular movida pela deputada federal Natália Bonavides (PT) e pelo vereador natalense Daniel Valença (PT).

Os editais para escolha das OSSs foram publicados em 14 de julho. A previsão da Prefeitura era que os novos contratos tenham duração inicial de dois anos, com possibilidade de prorrogação por até dez anos. A troca de gestão estava programada para ocorrer a partir de 15 de setembro, mas terá de ser adiada.
Segundo a decisão, os estudos técnicos apresentados pelo Município não trazem dados objetivos nem comparativos de custos capazes de justificar a escolha do modelo de terceirização. O magistrado destacou que os documentos mencionam apenas “formulações genéricas sobre otimização do padrão de qualidade”, sem apresentar indicadores concretos de desempenho ou memória de cálculo detalhada.
Para o juiz, a ausência de estudos adequados compromete a legalidade dos editais e pode causar risco de dano ao patrimônio público, já que o valor estimado dos contratos é de R$ 114 milhões por ano.
Deficiências apontadas
Entre os pontos levantados, a decisão registra que não houve levantamento sobre:
- quantitativo de demandas já atendidas pelas UPAs sob gestão direta;
- indicadores objetivos de desempenho (como tempo de espera e taxa de resolutividade);
- projeções comparativas demonstrando que o modelo terceirizado alcançaria resultados superiores;
- experiências semelhantes que justificassem a mudança.
O juiz ressaltou que, embora a administração tenha discricionariedade para escolher modelos de gestão, todos os atos precisam ser motivados por fundamentos técnicos consistentes. “A suspensão cautelar permite a correção dos vícios identificados antes da implementação, evitando danos maiores ao patrimônio público”, registrou na decisão.
Prefeitura já havia suspendido cronograma
Antes mesmo da decisão judicial, a Prefeitura do Natal havia anunciado a suspensão do cronograma da seleção das OSS para as UPAs, alegando necessidade de ajustes no processo administrativo. A medida foi divulgada na semana passada. Agora, com a liminar deferida, a gestão municipal fica proibida de praticar qualquer ato voltado à continuidade dos certames até nova deliberação judicial.
Próximos passos
O juiz determinou que o secretário municipal de Saúde, Geraldo Pinho, seja intimado a cumprir a decisão e que os autos sejam remetidos ao Ministério Público, que terá 30 dias para se manifestar. A Prefeitura ainda pode recorrer.
Processo no Tribunal de Contas
Além da ação na Justiça, a terceirização das UPAs de Natal também é discutida no Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Norte (TCE-RN). Na semana passada, o relator do caso, conselheiro Marco Antônio Montenegro, votou para suspender os contratos de terceirização.
O voto foi publicado na sexta-feira 5 e ainda será analisado pelos demais conselheiros da Primeira Câmara. A análise, porém, foi interrompida por causa de um pedido de vistas do conselheiro George Soares.
O voto do conselheiro se baseia em falhas nos “Estudos Técnicos Preliminares” (ETPs) que fundamentaram os chamamentos públicos. Segundo o relator, os documentos contêm generalidades e não apresentam dados concretos que demonstrem vantagem econômica ou melhora na qualidade dos serviços.
Entre os pontos apontados estão a ausência de memória de cálculo, de planilhas de custos e de comparativos com a gestão pública direta. Também não há indicadores atuais — como tempo de espera, taxa de resolutividade e custo por atendimento — confrontados com projeções do modelo terceirizado.
Um parecer técnico do próprio TCE, publicado no mês passado, já recomendava a suspensão imediata dos editais até o julgamento final. O documento alertava para a falta de transparência, a ausência de estudos econômicos detalhados e a não participação do Conselho Municipal de Saúde.