Dá para imaginar uma pessoa tímida sendo sexológa? E ainda dona de Sex Shop? Dá, se essa pessoa é FLÁVIA CHIANCA, 45. Empresária, mãe, apaixonada pelas pessoas e por suas histórias, alguém que acredita profundamente na potência do autoconhecimento, do cuidado mental e do próprio corpo. Há 12 anos quando decidio ter o próprio negócio, em Pipa, não imaginava onde chegaria, na missão da própria vida: levar educação sexual com informação. Transformou a La Vedette, num espaço de acolhimento e escuta. O lugar virou o ponto turístico mais visitado da Pipa – depois das praias.
A cada conversa com clientes, percebia o quanto as pessoas tinham dúvidas, bloqueios e sofrimentos relacionados ao assunto. Foi esse contato direto com o público que despertou nela o desejo de se aprofundar no tema de forma técnica e responsável. Voltou aos estudos e se formou em Psicologia, com pós em Sexologia e agora se especializa em Neuropsicologia. É membro da Associação de Terapias Cognitivo-Comportamental do RN e da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. Gosta de ler tanto quanto uma boa noite de sono, herdou do avô a curiosidade por pássaros, não resiste a um jogo de tabuleiro e nem a uma boa comidinha nordestina. Uma mulher que se inspira em outras, que valoriza os encontros, amizades e não passa mais de 24h remoendo uma emoção. Que é ligada no 220 volts, é empática,apaixonada e vê a beleza da natureza e que tem como superstição não entrar no mar sem pedir licença a Iemanjá.

Como decidiu atuar no segmento de sex shop?
Quando quis empreender na Praia da Pipa procurei o SEBRAE e em um dos estudos de mercado na época, percebi o nicho de destino de lua de mel em alta e quis apostar no setor. Como estava em Pipa, pude usar toda criatividade para montar um espaço atrativo e turístico focado nos casais, mas que atendesse pessoas do mundo todo e que misturasse o estilo clássico de uma boutique com toques de sedução do universo burlesco-erótico e que se transformou nesse grande sucesso que somos hoje.
Qual o diferencial do seu negócio?
Nosso grande diferencial está no olhar cuidadoso que percebe em minutos que a pessoa não está ali apenas para comprar algo, mas vivenciar uma experiência que é pensada para respeitar os limites, as histórias e os desejos de cada pessoa que ali entra. Temos escuta ativa, conhecimento técnico e empatia — em grande parte fruto da minha atuação como psicóloga e sexóloga. Além disso, promovemos eventos, cursos e palestras com foco na saúde sexual e afetiva. Queremos ajudar as pessoas a se reconectarem com o próprio prazer, com informação, liberdade e autonomia.
Como virou Sexologa?
Quando abri a La Vedette observei uma lacuna: percebia que, apesar de vivermos em um mundo repleto de estímulos sexuais, havia (e ainda há) muita desinformação, vergonha e solidão em torno do tema. Isso me inquietou, porque o autoconhecimento é a base para uma experiência sexual plena.
Porque há tantos tabus sobre sexo?
Os tabus sobre sexo existem porque a sexualidade foi, por séculos, tratada com repressão, medo e silêncio — principalmente quando se trata da sexualidade feminina. O corpo virou um campo de controle social, político e religioso. E o prazer, em vez de ser visto como uma expressão natural da vida, foi cercado de culpa, vergonha e julgamento. Isso faz com que falar sobre sexo ainda seja um desafio para muitas pessoas, mesmo em tempos de tanta informação. Meu trabalho é justamente ajudar a romper esse ciclo, com escuta, afeto e conhecimento, para que o sexo volte a ocupar seu lugar de direito: o de uma vivência saudável, consensual e livre.
Quais os desafios do seu segmento?
Um dos maiores desafios é lidar com o preconceito que ainda cerca tanto a sexualidade quanto o trabalho em sexshops e a atuação da sexologia como ciência. Ainda existe quem pense que prazer é futilidade ou que falar sobre sexo é algo vulgar. Outro desafio é equilibrar o acolhimento clínico com a parte comercial do meu trabalho — vender produtos que promovem saúde e bem-estar sem cair em estereótipos. Também sinto que ainda precisamos avançar muito na educação sexual de base, para que menos pessoas cresçam desconectadas do próprio corpo e da própria história.
O que o ofício te ensina?
Meu ofício me ensina, todos os dias, sobre a potência da escuta, sobre respeitar o tempo do outro e sobre como o prazer pode ser um caminho de cura. Aprendo que a sexualidade é um território muito mais amplo do que o senso comum acredita: ela passa pelo afeto, pela autoestima, pela identidade e até por questões sociais e políticas. E aprendo também que, quando uma pessoa se reconecta com o próprio desejo, muita coisa na vida dela floresce.
O que diria para as pessoas que não se permitem ir a uma sexshop?
Sex shop não é sobre ‘ser pervertido’ ou ‘ousado demais’, é sobre se conhecer, se permitir sentir prazer, descobrir o que gosta e, acima de tudo, se cuidar. É um espaço de liberdade, de autoconhecimento e empoderamento. Acredite, você merece esse cuidado e outra, ninguém vai te julgar, até porque está todo mundo lá pelo mesmo motivo: viver o prazer com leveza e bom humor. Bora se permitir, que a vida é curta e o vibrador é recarregável!
O que Flávia de hoje diria para a versão mais jovem?
Coragem. Vão dizer que você não pode, não deve, que é nova demais ou velha demais, vão dizer que tem que escolher entre família ou carreira. Que é meiga demais, bruta demais, vão dizer que é loucura ou que foi sorte. Não acredite. Siga, tenha coragem.