O comerciante Cláudio Crespi, de 55 anos, um dos 25 casos confirmados de intoxicação por metanol em São Paulo, recebeu alta neste domingo 12 após quase duas semanas internado. Ele apresentou sequelas e atualmente tem cerca de 10% da visão.
Segundo a advogada Camila Crespi, sobrinha do comerciante, Cláudio foi levado à UPA da Vila Maria, na Zona Norte da capital, onde uma médica suspeitou de intoxicação por metanol e solicitou um destilado como antídoto.

“O hospital não tinha o antídoto. Eu fui buscar uma vodca em casa. Estava fechada. Eu e meu marido não bebemos, e a vodca russa estava em casa fechada e pronta para o meu tio usar. Na hora do desespero, a médica pediu um destilado e lembramos que tinha essa em casa”, relatou.
A bebida foi usada pelos médicos por cerca de quatro dias sob controle hospitalar. “Ajudou a estabilizá-lo. A hemodiálise que fez a diferença”, disse Camila. Cláudio ficou em estado grave e chegou a ser entubado. Segundo a família, a mãe se despediu do filho no leito. No dia 2 de outubro, ele acordou do coma e, quatro dias depois, deixou a UTI.
A Secretaria Municipal da Saúde informou que o procedimento seguiu orientação do Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox).
“Protocolo reconhecido e utilizado em situações emergenciais com bons resultados clínicos. O procedimento foi acompanhado por um familiar que também é médico. A administração do antídoto (o próprio etanol) deve ser realizada em um equipamento de saúde, para impedir que o corpo transforme o metanol em substâncias tóxicas”, afirmou a pasta em nota.
Após a alta, Cláudio agradeceu pela recuperação. “Muita gratidão a Deus, aos médicos e a todos que torceram pela recuperação. Agora é dar continuidade no tratamento da visão e confiamos nas autoridades públicas para que faça o que for preciso para que não haja mais vítimas.”
O comerciante contou que passou mal em 26 de setembro, um dia após consumir uma dose de vodca em um bar. “Bebi uma dose e no sábado, na parte da manhã, eu fui para o hospital com uma dor de cabeça. Chegando lá falaram que eu estava com pneumonia. Eu só me lembro de três dias para cá”, afirmou.
“Os meus sintomas agora: um pouco só de [dificuldade na] respiração e a visão, que eu tenho só 10%. Mas eu fiquei sem falar, sem andar. Fiquei debilitado totalmente. Não sei ainda o futuro. Eu sei que eu ganhei uma vida nova”, disse Cláudio.
De acordo com o hepatologista Rogério Alves, do Hospital Beneficência Portuguesa, o metanol é um tipo de álcool tóxico. “Depois de ingerido, no fígado, ele se transforma em formaldeído e ácido fórmico, que atacam o nervo óptico, podendo causar cegueira, e também o sistema nervoso, podendo levar à morte.”
O médico explicou que “os principais antídotos são o fomepizol, que é o ideal, e o etanol, usado no hospital quando o fomepizol não está disponível. Também se usa hemodiálise e bicarbonato para eliminar o veneno e corrigir o sangue. O etanol bloqueia a enzima do fígado que transforma o metanol em veneno. Assim, o metanol é eliminado antes de causar dano”.
Ele alertou ainda que “mesmo sendo o álcool presente em bebidas, o etanol também é tóxico quando usado em excesso, e pode causar coma, lesão no fígado e hipoglicemia”.
O Ministério da Saúde informou que 2,5 mil doses do antídoto fomepizol foram adquiridas por meio da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), e 2 mil delas chegaram na quinta-feira 9 ao centro de distribuição em Guarulhos.
O remédio deve ser administrado sob acompanhamento médico e conforme norma técnica que prevê o uso em pacientes que apresentem sintomas após ingerirem destilados entre 6 e 72 horas antes e que tenham alterações em dois exames laboratoriais.
Segundo boletim estadual divulgado na sexta-feira 10, há 25 casos confirmados de intoxicação por metanol em São Paulo, 160 em investigação e 189 descartados. Cinco mortes foram confirmadas — três homens de 54, 46 e 45 anos, moradores da capital; uma mulher de 30 anos, de São Bernardo do Campo; e um homem de 23 anos, de Osasco. Outras seis mortes seguem sob investigação.