09/10/2020 | 12:12
Em entrevista ao jornal alemão Deutsche Welle, o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, condenado por tortura na ditadura militar, foi um homem de “honra”, “que respeitava os direitos humanos de seus subordinados”. O nome de Ustra ficou entre os assuntos mais comentados na manhã desta sexta-feira, 9, no Twitter. As informações são do O Globo.
O militar, que morreu em 2015, aos 83 anos, é apontado por dezenas de perseguidos políticos e familiares de vítimas do regime militar como responsável pelas perseguições, tortura e morte de opositores do golpe de 64.
Mourão afirmou que a tortura não é uma prática que o governo brasileiro concorda ou “simpatize”, mas comentou que muitas pessoas que lutaram contra guerrilhas urbanas nos anos 60 e 70 foram “injustamente acusadas de serem torturadoras”.
“Em primeiro lugar, não estou alinhado com a tortura, e, claro, muitas pessoas ainda estão vivas daquela época, e todas querem colocar as coisas da maneira que viram. É por isso que eu disse antes que temos que esperar que todos esses atores desapareçam para que a história faça sua parte. E, claro, o que realmente aconteceu durante esse período … esse período passou”, disse.
Mourão afirmou que, durante a ditadura, os militares “fizeram coisas muito boas pelo Brasil e outras coisas não foram tão bem” e disse que a “história só pode ser julgada com o passar do tempo”.
“Ainda estamos a cerca de 50 anos desse período. Precisamos de mais 50 anos para que esse período seja bem avaliado”, acrescentou.
O vice-presidente afirmou também que a democracia é um dos objetivos nacionais permanentes e que o governo quer tornar o Brasil a “democracia mais brilhante do hemisfério Sul”.
Questionado se o posicionamento do presidente Jair Bolsonaro após o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizar operação da Polícia Federal contra aliados do presidente, no âmbito do inquérito das fake news, em que o presidente afirmou que as Forças Armadas “não cumprem ordens absurdas”, Mourão disse que não se tratava de uma ameaça.
“As Forças Armadas estão alinhadas com sua missão constitucional, e não estão saindo dela. As coisas aqui no Brasil estão tranquilas e indo bem. E deixo bem claro que a democracia é um valor não só para o governo Bolsonaro, mas também para as nossas Forças Armadas. Então não existe nenhuma ameaça ao Supremo Tribunal Federal ou ao sistema Legislativo aqui no Brasil”, afirmou.
O vice-presidente disse ainda que a participação de Bolsonaro em atos que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo também não eram uma ameaça à democracia. E disse que a afirmação do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que viu “agressões gratuitas à democracia” na ocasião, eram ocasionadas pela “polarização na política”.
“Não, isso acontece porque há polarização na política. O governo de São Paulo se opôs a Bolsonaro. Isso é muito mais conversa do que, digamos, ação”, comentou.
Questionado se essa era uma conversa perigosa, o vice-presidente afirmou que não, já que “ninguém tem poder de fazer o que quer aqui no Brasil”.
“Não, não é perigosa. É perigoso quando você tem poder de fazer o que quer, mas ninguém tem poder de fazer o que quer aqui no Brasil”, afirmou.
Condenado por tortura
Ustra era conhecido nos porões da ditadura como “Dr. Tibiriçá”, ele era o único militar brasileiro declarado torturador pela Justiça.
O Dossiê Ditadura, da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, relaciona o coronel com 60 casos de mortes e desaparecimentos em São Paulo. A Arquidiocese de São Paulo, por meio do projeto Brasil Nunca Mais, denunciou mais de 500 casos de tortura cometidos dentro das dependências do Doi-Codi no período em que Ustra era o comandante, de 1970 a 1974.
Em 2015, o Ministério Público Federal (MPF), ofereceu denúncia contra Ustra. Ele é apontado como responsável pela morte do militante comunista Carlos Nicolau Danielli, sequestrado e torturado nas dependências do Destacamento de Operações e Informações do (DOI), em São Paulo, em dezembro de 1972.