Ana Caldas Lewinsohn, responsável pela organização e publicação do livro “A Notável História do Homem-Listrado”, compartilha em entrevista à Cultue os detalhes do processo que trouxe à luz uma obra singular da renomada artista Fayga Ostrower. O livro, originalmente concebido em 1947 como um presente para seu sobrinho Peter Lewinsohn, permaneceu guardado na família até 2017, quando Ana Caldas Lewinsohn se deparou com sua beleza única e decidiu que deveria ser compartilhado com o mundo.
O processo de organização envolveu uma cuidadosa busca pela editora, a tradução para o português pelo pai de Ana, Thomas Lewinsohn, e a colaboração do designer Rafael Campos da Editora da UFRN (EDUFRN). O resultado foi uma edição bilíngue que preserva a essência da obra original e a enriquece com elementos gráficos que respeitam a paleta de cores e a graça única de Fayga Ostrower.
Além da publicação, a história ganhou vida em uma exposição na Galeria do Núcleo Arte e Cultura da UFRN, coincidindo com o centenário de nascimento da artista. Ana Caldas Lewinsohn destaca a importância histórica do livro, revelando uma faceta até então desconhecida de Fayga, reconhecida internacionalmente por suas contribuições nas artes plásticas.
A notícia da indicação ao Prêmio Jabuti foi recebida por Ana Caldas Lewinsohn como uma bela surpresa e uma honra. A entrevistada compartilha sua emoção ao representar a obra no maior prêmio literário do Brasil, ressaltando a importância de dar continuidade à missão de divulgar o legado de Fayga Ostrower.
A premiação está marcada para o próximo dia 5 de dezembro, e as expectativas são altas. No entanto, Ana Caldas Lewinsohn enfatiza que estar entre os cinco finalistas na categoria Ilustração já é uma realização e que qualquer resultado será recebido com gratidão. Confira a entrevista:
Cultue – Como foi o processo de organização do livro?
Ana Caldas Lewinsohn – Foi um processo muito especial e feito com grande dedicação e delicadeza. O livro original, escrito e ilustrado por minha tia-avó, Fayga Ostrower, em 1947, estava guardado na família, com as filhas de Peter Lewinsohn, para quem ela fez o livro quando nasceu. Era um único exemplar e todo feito de forma artesanal. Quando conheci a obra em 2017, percebi que deveria ser publicado, em função de tamanha beleza em seus traços e da história narrada, além do fato de ser a única obra infantil de Fayga. Entendi que era uma raridade e deveria chegar ao conhecimento e fruição do grande público. Assim, comecei a busca por uma editora e, em 2020, em comemoração ao centenário de nascimento de Fayga, Noni Ostrower, sua filha e presidente do Instituto Fayga Ostrower, criou um programa de doação de parte do acervo para instituições pelo Brasil. Conversei com Teodora Alves, diretora do Núcleo Arte e Cultura da UFRN e por meio desse programa a UFRN recebeu mais de 70 obras da artista, que agora compõem o acervo permanente do NAC. Nesse mesmo momento, propomos para a Editora da UFRN (EDUFRN) junto ao NAC a publicação do livro, também como uma ação comemorativa. Devido a pandemia, esse plano foi adiado e o livro foi publicado no final de 2022 e lançado em 2023, junto à inauguração da exposição de parte desse acervo, na galeria do NAC. Para a organização do livro, foi realizada a tradução para o português pelo meu pai, Thomas Lewinsohn, já que o livro havia sido escrito originalmente em alemão. Dessa forma, fizemos uma edição bilingue. Rafael Campos, designer da EDUFRN, fez um trabalho primoroso de recriar a grafia de Fayga pintada à mão, para a tradução em português, além de utilizar elementos gráficos e figuras do livro na composição desta edição, utilizando a mesma paleta de cores. Também adicionamos fotos de Fayga contando um pouco de sua trajetória e a história do livro, que foi concebido num momento de imensa alegria na família. Fayga e os irmãos migraram para o Brasil fugidos do nazismo no período entre guerras e, somente após o fim da segunda guerra mundial, nasce a primeira criança livre e brasileira, seu sobrinho Peter, para quem ela elabora A Notável História do Homem-Listrado.
Cultue – Como você recebeu a notícia da indicação?
Ana Caldas Lewinsohn – Foi uma bela surpresa receber a notícia da indicação! O coração está radiante e honrado por ter o reconhecimento de estar numa lista tão seleta no maior prêmio literário do Brasil. Desde que conheci o livro original tomei a publicação como uma missão, algo que eu deveria fazer. Sinto-me como um vetor que está realizando algo que é grandioso e, ter chegado até essa etapa do prêmio já é uma imensa conquista. Creio que Fayga ficaria muito feliz por sua segunda indicação ao prêmio Jabuti! Ela venceu em 1999 com o livro A Sensibilidade do Intelecto que, infelizmente, encontra-se esgotado. Toda a sua obra e seus escritos no campo da arte são inspiradores para o meu trabalho e, acredito, para muitos artistas e arte-educadores. Então é uma alegria sem tamanho dar continuidade nesse processo de divulgação das obras de Fayga.
Cultue – Qual sua avaliação a respeito da importância deste livro? E a importância de representar o RN no maior prêmio de literatura do país?
Ana Caldas Lewinsohn – Esse livro tem uma importância histórica, além de sua narrativa ter a possibilidade de muitas leituras. Fayga é conhecida nacional e internacionalmente por suas obras nas artes plásticas, como ilustradora, desenhista, gravurista, pintora, teórica da arte e professora. Recebeu importantes prêmios durante a sua vida, no Brasil e no exterior. No entanto, essa é sua única obra infantil, até então desconhecida, já que estava guardada pela família. A ilustração tem traços econômicos, com uma composição de cores suave e muito expressiva! A história é singela e densa, talvez por isso tenha encantado tanto o público infantil como o adulto. O livro aborda a importância da identidade de uma família e de um povo, de uma maneira divertida e criativa. Certamente Fayga ficaria feliz em saber que o livro foi publicado por uma editora do Rio Grande do Norte. Ela visitava muitos estados no Brasil proferindo palestras, e sua visão de arte era a mais humanista e democrática possível, lutando para que o desenvolvimento da sensibilidade por meio da prática artística, fosse algo a ser implementado em todas as camadas sociais e localidades. Agora o Rio Grande do Norte abriga um belo acervo de suas obras e está sendo indicado para o prêmio Jabuti, o que é motivo de muito orgulho. Muitas ações devem se desdobrar a partir dessas conquistas, com o intuito de realizar cada vez mais o papel de democratizar a arte e trabalhar em prol da sensibilidade e criatividade humana.
Cultue – A premiação acontece no próximo dia 5 de dezembro. Qual a expectativa?
Ana Caldas Lewinsohn – A expectativa é grande, mas todas as obras indicadas para a categoria de ilustração são belíssimas! Poder estar presente na premiação já é um presente, estar na lista dos cinco finalistas já é uma realização. Então, penso que a vitória já aconteceu por chegarmos até aqui e, o que vier, é lucro! Se o livro for premiado como vencedor, será merecido. Está lindíssimo.