A primeira espécie troglóbia descoberta no Rio Grande do Norte acaba de ser descrita, mas já pode estar em risco de extinção. A espécie, denominada Brasilana spelaea, é um Cirolanidae (família de isópodes aquáticos) que só ocorre em habitats subterrâneos do RN e do Ceará. A descrição foi publicada na revista científica internacional “Zootaxa”, especializada em zoologia e taxonomia de animais, em setembro.
A nova espécie é considerada tão diferente das outras já conhecidas em sua família que um novo gênero (Brasilana) precisou ser criado. As espécies troglóbias só ocorrem em ambientes subterrâneos e são consideradas importantes indicadores da qualidade ambiental das cavernas e do seu ambiente.

Segundo o artigo, a Brasilana spelaea pode estar ameaçada devido à indústria de calcário, ao turismo desregulado e à exploração das águas subterrâneas na maioria das áreas onde ocorre.
Diego Bento, analista ambiental do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (ICMBio/Cecav) e um dos autores da pesquisa, afirmou que a espécie foi a primeira descoberta no Rio Grande do Norte “há mais de 20 anos”. Ele a descreveu como um “relicto oceânico (descende de ancestrais marinhos)”. Até o momento, só são conhecidos relictos oceânicos nessa região do Brasil.
O servidor do ICMBio também descreveu que a raridade da descoberta chamou a atenção de pesquisadores, sendo considerada o estopim de quase todas as pesquisas bioespeleológicas que hoje colocam o Rio Grande do Norte entre as principais áreas brasileiras em riqueza de espécies troglóbias.
Origem da biodiversidade e ações de conservação
Pesquisas indicam que as mudanças geológicas e paleoclimáticas ocorridas ao longo de milhões de anos no RN foram a origem dessa biodiversidade subterrânea única.
Quase metade das espécies atualmente conhecidas de troglóbios aquáticos (16 das 40 já descobertas), os chamados estigóbios, são relictos oceânicos. A origem dessas espécies está ligada a transgressões (avanços) e regressões (recuos) oceânicos: seus ancestrais marinhos colonizaram espaços subterrâneos quando o nível do oceano subiu, e ficaram presos e se adaptaram às condições subterrâneas quando o mar recuou.
Outras diversas pesquisas sobre essas transformações climáticas estão descritas no livro recém-lançado “CaveRNas: o carste potiguar”.
A descoberta de novas espécies subterrâneas também norteia ações de conservação e proteção. Iniciativas como o desenvolvimento do turismo sustentável, que não implique em impactos negativos a ambientes sensíveis, como as cavernas; a definição de áreas prioritárias para conservação; avaliação do risco de extinção de espécies; programas de monitoramento e pesquisa científica, entre outras ações, são cruciais para melhor conhecer e conservar essa biodiversidade única.