Nenhum dos presidentes que ocuparam o Planalto desde a redemocratização teve um ministro da Justiça tão fiel e resiliente aos humores de seu presidente quanto Sérgio Moro.
De fato, o ex-juiz da Operação Lava Jato foi o que mais abriu inquéritos para proteger o seu chefe, mesmo depois de ser humilhado publicamente por ele algumas vezes.
Foram 12 inquéritos contra a honra do chefe, para ser mais preciso, contra quatro abertos pelo ministério da Justiça durante o período de Michel Temer; três durante os dois governos de Dilma Roussef e dois em ambos governos de Lula.
Na época de FHC, que governou o País por oito anos, o Ministério da Justiça não levou a cabo um único inquérito dessa natureza, embora o então presidente vivesse sendo esculhambado por seus adversários políticos.
O que explica isso foi a incomensurável determinação de Moro de permanecer no governo Bolsonaro, depois da arriscada operação de sair de uma carreira na qual havia se notabilizado pela caça aos corruptos, colocando-se à serviço de uma incógnita egressa do baixo claro do Congresso Nacional.
O dia seguinte ao pedido de demissão de Moro só fizeram confirmar o relacionamento de conveniências que ambos vinham mantendo até que o ex-ministro caiu atirando. E seu chefe foi a público lavar a roupa suja, como acontece com pessoas traídas que vão para um programa popular de TV expor suas constrangedoras situações.
Não parou no dia seguinte, com mensagens trocadas em rede social, nas quais barganhas foram expostas, como se Moro já não soubesse desde o início que seu chefe quisesse passe livre para usar os órgãos de controle estritamente a seu favor e contra os inimigos.
Moro só aceitou porque, claro, aspirava voos maiores, entre eles a cadeira do decano Celso de Mello, no Supremo, que se aposenta agora em novembro, ou, quem sabe, a cadeira do chefe em 2022.
Mas o fato é que, ao retirar dois ministros populares de seu governo em questão de semanas – Saúde e Justiça –, Bolsonaro finalmente foi coerente ao que sempre desejou: um clã no comando do país.
E com ministros totalmente submissos a ele, coisa inédita nesse grau em relação aos últimos presidentes que ocuparam o Planalto, entre os quais a própria Dilma Roussef, como o próprio Moro admitiu em seu pronunciamento de despedida.
Nesse dia, a mídia esqueceu por horas seguidas a pandemia que inicia sua trágica escalada pelo País, deixando como lelago a pobreza política em meio à tragédia sanitária.
Ou, como sentenciou no ano passado a alta comissária dos Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet, ao comentar uma defesa de Bolsonaro da ditadura de Augusto Pinochet no Chile, que matou 300 mil pessoas: “Sinto pena do Brasil”.