O mais inteligente dos mortais, segundo a mitologia grega, Sísifo enganou e desafiou os deuses repetidas vezes e foi castigado com a obrigação de rolar uma grande pedra montanha acima por toda a eternidade. O mito de Sísifo, facilmente, pode ser aplicado à batalha da Justiça Eleitoral brasileira para garantir a realização de eleições justas e limpas no Brasil em 2024 diante do avanço da inteligência artificial e outras tecnologias.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou 12 resoluções disciplinando regras a serem aplicadas nas eleições municipais deste ano. As novas regras preveem desde a proibição as deepfakes – simulações enganosas a partir de vídeos e áudios com montagens descontextualizadas e informações distorcidas –, a obrigação de aviso sobre o uso de IA na propaganda eleitoral, dentre outras medidas para disciplinar o processo.
A atualização das regras do jogo é inevitável e imprescindível diante da popularização do uso das ferramentas disponíveis para manipulação de imagens, vídeos e áudios. Ministros do TSE ressaltam que o uso indevido desses instrumentos tecnológicos com o objetivo de desinformar, prejudicar de forma ilegal adversários e ameaçar o processo eleitoral democrático pode resultar na cassação do registro de candidatura ou, no caso de candidatos eleitos, o próprio mandato eletivo.
O desafio maior, entretanto, não é a criação das regras e a previsão de punições legais em si. O grande titã a ser enfrentado não tem clareza em sua forma e, mesmo em 2024, se mostra imprevisível em razão da aura obscura que o cerca, visto que ainda não se sabe como se dará a dinâmica de produção desses conteúdos e a própria distribuição. A garantia de eleições justas e limpas vai além de identificar as peças de desinformação, noticias falsas ou mesmo mídias adulteradas.
Rastrear produtores, financiadores, fonte de recursos e os beneficiados diretos nas campanhas é parte indissociável da missão. As próprias plataformas que servem de repositórios para essas mídias precisam atuar preventivamente e proativamente para retirar os conteúdos publicados para minimizar danos. O Judiciário também necessita de agilidade para que as ações possam transitar em caráter urgente para evitar incertezas.
Sem falar nos partidos políticos e candidatos que devem, peremptoriamente, se recusar a utilizar esses recursos de maneira indevida para levar vantagem nas eleições. Não há dúvida que este último, em parte dos casos, é a razão maior do problema. Políticos na busca desenfreada pelo poder não se importam como, mas se vão ou não vencer o democracia. Enquanto eles se mostram “Sísifos” da modernidade, em desafio contínuo às leis, ao povo e à democracia, a sociedade precisa ser a pedra que os fará descer a montanha, mas em nosso caso, de forma que não possam mais ascender ao topo.