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Opinião

Artigo: Probidade e boa-fé, por Anísio Marinho

Confira artigo de Anísio Marinho Neto publicado na edição impressa do AGORA RN desta quarta-feira, dia 25 de outubro de 2023
Anísio Marinho Neto
25/10/2023 | 05:00

Os sistemas jurídicos são elaborados observando normas de Direito Consuetudinário pautadas, principalmente, no Direito Natural, em que duas colunas existem: a da boa-fé, sempre triunfante, que deve estar sempre de pé, e a da má-fé, que deve permanecer em ruínas. Todo o Direito dos povos deve obedecer a esse princípio de acolher a boa-fé e de repelir a má-fé. Assim, todos os ordenamentos jurídicos devem resguardar o princípio da boa-fé objetiva, ou seja, a que implica o dever dos contratantes, desde as tratativas iniciais, na formação, na execução e na extinção do contrato, bem como após esta, agir com boa-fé, sem o intuito de prejudicar ou de obter vantagens indevidas. Cito nesse passo, o parágrafo 242, do Código Civil alemão: “o devedor está obrigado a executar a prestação como exige a boa-fé, em atenção aos usos e costumes”. Destaco, ainda, o art. 1.337 do Código Civil italiano, de 1942, pelo qual os contratantes, “no desenvolvimento das tratativas e na formação do contrato devem comportar-se segundo a boa-fé”. Completa este dispositivo legal o art. 1.375, que determina que o contrato deve ser executado segundo a boa-fé. A seu turno, também merece realce o art. 227 do Código Civil português, de 1967, que assenta: “quem negocia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nas preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.

O ordenamento jurídico brasileiro sempre admitiu o princípio da boa-fé nas relações contratuais, porém foi somente através da edição do seu atual Código Civil de 2002, que expressamente, em seu art. 422, o normatizou dispondo que “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. Acrescente-se aqui que todos os Códigos Civis citados não cuidaram, convenientemente, da boa-fé objetiva, pois, além das tratativas iniciais (contratações preliminares de viabilidade negocial, minutas etc.), da conclusão do contrato (formação) e de sua execução, em que ela deve estar presente, deve, também, ser observada após sua extinção, em que há segredos das partes contratantes, por exemplo, que se conhecidos durante a contratação, devem ser preservados e não difundidos; além de outros valores. E o nosso Código Civil também traz, na sua parte geral, o art.113, preceito mais abrangente, segundo o qual “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. Essa interpretação elide qualquer intento de má-fé ou de descumprimento de deveres de lealdade entre os contratantes, como os existentes após a extinção do contrato.

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Ordenamento jurídico brasileiro sempre admitiu o princípio da boa-fé nas relações contratuais - Foto: Reprodução

*por Anísio Marinho Neto, que é professor e procurador de Justiça.