A realidade brutal do sistema de saúde no Rio Grande do Norte — onde 34 crianças, entre elas três recém-nascidos, se debatem na fila de espera por cirurgias cardíacas urgentes — expõe uma chaga aberta na administração pública brasileira. Este cenário desesperador, que se estende a 71 adultos, incluindo 49 idosos aguardando cateterismos urgentes, é mais do que uma falha operacional; é o sintoma de um mal mais profundo, uma indiferença enraizada na classe política e nos gestores públicos que se distanciaram das necessidades básicas do povo.
Diante dessa tragédia que se desenrola sob os holofotes da urgência, emerge uma pergunta contundente: por que nossos políticos e detentores de cargos públicos deveriam gozar de privilégios na saúde que seus eleitores não têm? A resposta é crua e simples: não deveriam.
Defendemos, portanto, uma mudança radical na lei. Se os arquitetos e mantenedores do sistema público de saúde estivessem vinculados a ele pelos laços inalienáveis da própria necessidade de saúde, assistiríamos a uma revolução na qualidade dos serviços oferecidos à população. Exigir que políticos e detentores de cargos públicos se despojem de seus planos de saúde particulares e dependam exclusivamente do serviço público é impor um senso de urgência, é garantir que cada decisão, cada assinatura, reflita a realidade vivida por milhões de brasileiros. Afinal, ao político cabe a missão de zelar pelo que é público como representante do povo.
Isso é mais do que uma proposta utópica; é uma chamada para que os responsáveis pela gestão da saúde pública enfrentem as mesmas realidades que a população que juraram servir. A diferença seria palmar: o político que padece no aguardo de uma cirurgia cardiológica, que testemunha o desespero de um pai cujo filho está entre a vida e a morte, esperando por um procedimento urgente, terá muito mais dificuldade em ignorar as falhas do sistema do que aquele que se refugia na comodidade de um plano de saúde premium.
Quando a indiferença se instala no coração dos que têm por mandato a gestão da coisa pública, é sinal de que a distância entre governantes e governados atingiu seu ápice. Que os tribunais não sejam a única instância onde se busca justiça e equidade na saúde. Que os legisladores e gestores experimentem a amarga pílula da espera, para que a empatia volte a ser a base da legislação e da administração.
É chegado o momento de os políticos provarem de sua própria medicina para que, finalmente, possamos curar as enfermidades de um sistema que está em estado crítico. Só assim poderemos aspirar a um sistema de saúde que não apenas sobreviva, mas prospere, baseado na justiça e na equidade. O coração da nação não pode mais aguentar o peso de tanta indiferença.