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Saúde

Um em cada cinco brasileiros já experimentou drogas ilícitas, aponta levantamento da Unifesp

Consumo cresce entre mulheres e adolescentes, com avanço de substâncias sintéticas; cannabis segue como a droga mais usada no País
Redação
24/12/2025 | 12:18

Cerca de um em cada cinco brasileiros — o equivalente a 18,7% da população — já experimentou ao menos uma vez substâncias psicoativas ilícitas, segundo a atualização do Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), elaborado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Os dados revelam um cenário de expansão do consumo no País, com mudanças relevantes no perfil dos usuários, sobretudo entre mulheres e adolescentes, e maior presença de drogas sintéticas em contextos urbanos.

De acordo com o estudo, 23,9% dos homens relataram já ter usado drogas ilícitas alguma vez na vida, ante 13,9% das mulheres. Entre os jovens menores de idade, porém, o levantamento identificou uma inversão do padrão tradicional: a proporção de meninas que experimentaram drogas supera a de meninos, o que acende um alerta para políticas de prevenção direcionadas a esse público.

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Usuários de crack em "encontro coletivo" em São Paulo - Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

A pesquisa estima que 8,1% da população — mais de 13 milhões de pessoas — fizeram uso de drogas até um ano antes da entrevista. Entre adultos, o consumo saltou de 6,3% em 2012 para 15,8% em 2023. O crescimento foi ainda mais expressivo entre as mulheres, grupo no qual o índice triplicou, passando de 3% para 10,6% no período.

Esta terceira edição do Lenad manteve a metodologia das pesquisas realizadas em 2006 e 2012. Ao todo, foram aplicados 16.608 questionários a pessoas com 16 anos ou mais, em entrevistas realizadas entre 2022 e 2023. O levantamento foi feito em parceria com a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senad/MJSP) e com a Ipsos Public Affairs.

“Os achados do Lenad apontam os grupos em maior risco quanto ao consumo problemático de drogas no País, ficando clara a necessidade de priorizarmos as meninas, em especial as mais jovens”, afirmou, em nota, a pesquisadora Clarice Madruga, uma das responsáveis pelo estudo.

Além do crescimento do consumo, o material descreve uma concentração maior entre jovens adultos de 18 a 34 anos e aponta as regiões Sul e Sudeste como as de maior prevalência de uso. O estudo indica ainda relativa estabilidade no consumo de cocaína e crack, ao mesmo tempo em que observa sinais consistentes de expansão de estimulantes sintéticos e alucinógenos, sobretudo em ambientes recreativos urbanos.

No cenário internacional, o Lenad III posiciona o Brasil em um patamar intermediário de prevalência de uso de drogas. Ainda assim, o País combina esse nível com elevada carga de transtornos associados ao consumo, o que gera impacto significativo sobre a rede de atenção psicossocial, os serviços de urgência e emergência e as políticas públicas setoriais.

Cannabis lidera consumo e preocupa entre adolescentes

A cannabis — que inclui maconha, skank e haxixe — permanece como a substância ilícita mais consumida no País. Mais de 10 milhões de brasileiros relataram uso no período de até um ano antes da pesquisa, o que corresponde a 6% da população. Ao longo da vida, cerca de 28 milhões de pessoas com 14 anos ou mais já experimentaram a droga, o equivalente a 15,8%, o dobro do índice registrado em 2012. O aumento foi mais acentuado entre mulheres.

Entre adolescentes de 14 a 17 anos, o levantamento estima ao menos 1 milhão de usuários esporádicos, metade deles com consumo recente. Diferentemente das edições anteriores, o uso caiu entre meninos — de 7,3% para 4,6% — e avançou de forma expressiva entre meninas, cujo índice passou de 2,1% para 7,9%.

O padrão de uso também chama atenção. Mais da metade dos usuários de cannabis (54%) relataram consumo diário por pelo menos duas semanas consecutivas, o que representa 3,3% da população ou cerca de 3,9 milhões de brasileiros. Aproximadamente 2 milhões de pessoas preenchem critérios para dependência da substância, equivalente a 1,2% da população ou um em cada três usuários.

O estudo aponta ainda que 3% dos usuários já procuraram atendimento de emergência em razão do consumo. Entre adolescentes, esse percentual sobe para 7,4%, indicador que, segundo os pesquisadores, revela maior vulnerabilidade a intoxicações e crises agudas.

Avanço de sintéticos e desafios às políticas públicas

O Lenad também registrou crescimento da experimentação de drogas sintéticas e psicodélicas na última década. O uso de ecstasy passou de 0,76% para 2,20%; o de alucinógenos, de 1,0% para 2,1%; e o de estimulantes sintéticos (ATS), de 2,7% para 4,6%. Para os pesquisadores, esses dados refletem um mercado de drogas mais complexo e com riscos ampliados aos consumidores.

Segundo o estudo, a maior presença dessas substâncias agrava o cenário para adolescentes, especialmente meninas, consideradas mais vulneráveis a eventos adversos, sofrimento psíquico, poliuso e necessidade de atendimento emergencial. Diante desse quadro, os autores defendem a revisão das estratégias preventivas, com ações sensíveis às questões de gênero, integradas à promoção da saúde mental e à redução da violência e da discriminação.

Os resultados reforçam, ainda, a importância da vigilância epidemiológica sobre álcool e outras drogas como função permanente do sistema de saúde e de proteção social. Para os pesquisadores, levantamentos como o Lenad são fundamentais para manter a sociedade e os gestores públicos informados, orientando políticas de prevenção, cuidado e tratamento no País.

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