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Coluna

Que danado é capacitismo?

Confira a coluna de José Bezerra Marinho desta sexta-feira 14
José Bezerra Marinho
14/06/2024 | 08:55

A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte protagonizou, ao longo de sua existência, eventos que representam extraordinárias conquistas sociais e políticas, não só do Estado, mas de toda a nação.

Na última quarta-feira, dia 12 de junho, outro desses momentos históricos foi vivido. Por proposição do presidente da Casa, deputado Ezequiel Ferreira, foi realizada uma audiência pública para lançamento de uma campanha contra o capacitismo.

Lançamento da Campanha Capacitismo (103)
Lançamento da Campanha Capacitismo - Foto: José Aldenir / AgoraRN

Nosso parlamento é o primeiro do País a levantar o tema com a devida magnitude. Mas, afinal, o que é capacitismo?

Através dessa campanha, pela primeira vez, a maioria da nossa população ouvirá a palavra capacitismo e terá consciência da gravidade da discriminação e preconceito que ela carrega.

Capacitismo é o preconceito contra as pessoas com deficiência, em que se julga que elas não são capazes ou são inferiores.

A palavra é relativamente nova. Passou a ser usada no Brasil por volta de 2014, mas o preconceito é antigo, imemorial.

E aí está o desafio: nós nascemos e nos desenvolvemos em uma cultura que tem, de forma sedimentada, a ideia normativa do corpo ideal. Esse entendimento coloca a deficiência acima do sujeito, e não como uma característica dele.

Estamos, pois, diante do chamado problema complexo.

A professora Lia Vainer, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), nos alerta: se tudo acontecer dentro da normalidade, teremos um mundo com machismo, misoginia e racismo. E podemos acrescentar: etarismo, capacitismo, gordofobia, LGBTfobia, transfobia, e por aí vai.

Ou seja, não se vencerá o combate contra o capacitismo isoladamente. É necessário que tenhamos uma profunda mudança cultural na nossa sociedade.

Esta é a razão do presidente Ezequiel haver registrado na abertura da Audiência Pública do último dia 12 de junho:

“A exclusão social e a falta de acessibilidade também são pontos chaves na campanha. Precisamos melhorar, avançar nesses itens que ainda estão em desenvolvimento na nossa sociedade. Precisamos de políticas públicas para pessoas com deficiência, cotas nas universidades, espaços no mercado de trabalho”, afirma Ezequiel Ferreira.

São demandas urgentes que precisam ser pensadas e planejadas.

Entre as sugestões apresentadas na audiência pública, houve uma da promotora Rebecca Monte Nunes, representando o Ministério Público Estadual do RN, que foi bem recebida pelo presidente Ezequiel Ferreira: levar imediatamente a campanha às escolas públicas e privadas.

Este é o caminho. Afinal, sociedade não é uma obra pronta. Ela é um processo em permanente construção, aperfeiçoamento. Para isso, precisamos desaprender e reaprender permanentemente.

Foi definido por estudiosos de diferentes campos que a forma de nos referirmos aos quase 19 milhões de brasileiros que são ou serão vítimas do capacitismo é “pessoa com deficiência” (PcD).

Note que a primeira palavra não é apenas a mais importante, é a definidora de uma nova atitude diante da questão. Estamos nos referindo à pessoa, à dignidade da pessoa humana, valor que há de ser prevalente a qualquer outro.

Sobre isso, nos diz o grande mestre José Afonso da Silva: “A Constituição, reconhecendo a sua existência (a dignidade da pessoa humana) e a sua eminência, transformou-a num valor supremo da ordem jurídica, quando declarada como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito”. Portanto, não apenas um princípio da ordem jurídica, mas o é também da ordem política, social, econômica e cultural. Daí sua natureza de valor supremo, porque está na base de toda a vida nacional.

Em decorrência direta da sábia decisão do Constituinte de 1988, temos hoje um corpo normativo que explicita, em alguns casos, nos mínimos detalhes, os direitos e a proteção da PcD, quanto ao respeito, acessibilidade física, social e profissional. Ao mesmo tempo, a sociedade conta com um Ministério Público vigilante e muito bem formado. O que nos falta é ampliarmos o acesso aos nossos corações e mentes.