O mundo vive um “adoecimento global” da saúde mental, especialmente entre adolescentes e jovens. A afirmação é da psicóloga Débora Sampaio, especialista em comportamento juvenil, em entrevista ao Jornal da Mix. Ela destacou que a crise, agravada nos últimos anos, exige uma abordagem multifacetada, com foco em prevenção, supervisão e diálogo. “O primeiro passo para prevenir essas situações é informação. Estamos falando de uma crise global, e informar é o que pode salvar vidas”, afirmou.
Débora ressaltou que adolescentes passam por mudanças naturais, como alterações de humor e busca por privacidade, mas destacou que mudanças persistentes precisam ser observadas. “Mudanças de humor que duram mais de uma ou duas semanas, isolamento ou irritabilidade excessiva são sinais de alerta. Muitas vezes, achamos que depressão é apenas choro constante e reclusão, mas, nos jovens, ela pode se manifestar como impaciência ou intolerância.”
A especialista reforçou que “adolescência é sinônimo de socialização”. Quando o jovem não se integra a um grupo — seja na escola, igreja ou em atividades esportivas —, isso pode ser um indício de problemas emocionais. “O adolescente tem uma necessidade de se sentir pertencente. Se ele está sem grupo, é motivo para os pais ficarem atentos”.
REDES SOCIAIS COMO FATOR AGRAVANTE. O impacto das redes sociais na saúde mental foi outro ponto central da entrevista. Débora alertou sobre o desequilíbrio entre o cuidado presencial e digital. “Hoje, há uma superproteção no mundo presencial e uma subproteção no digital. As redes sociais são onde os jovens passam a maior parte do tempo, muitas vezes sem qualquer supervisão dos pais”.
Ela destacou o papel das telas na crise de saúde mental. “Nos últimos 10 anos, tivemos um aumento de mais de 1.500% nos casos de ansiedade e depressão entre crianças e adolescentes. As telas mudaram toda a nossa forma de viver, mas, enquanto adultos, temos uma memória de vida sem elas. Já os jovens não têm esse repertório”.
Além disso, a exposição ao conteúdo violento ou inadequado pode influenciar comportamentos extremos. “Casos de ataques em escolas, como o que foi planejado recentemente em Natal, muitas vezes têm um efeito de modelagem. Os jovens pesquisam, estudam e replicam o que veem. Por isso, é fundamental que os pais saibam o que seus filhos estão consumindo online”.

SUPERVISÃO PARENTAL É INDISPENSÁVEL. Débora enfatizou que os pais têm um papel central na proteção dos jovens no mundo digital. “Os pais não apenas podem, mas devem supervisionar. Hoje, o ambiente mais perigoso é o digital. Não existe privacidade quando se trata de cuidado e proteção”.
Ela reforçou a necessidade de limitar o tempo de uso de dispositivos, usar aplicativos de controle parental e estabelecer regras como não permitir que o adolescente durma com o celular no quarto.
A psicóloga comparou o cuidado digital ao acompanhamento em situações presenciais. “Assim como os pais verificam com quem o filho vai para uma festa ou checam se ele consumiu álcool, devem supervisionar o uso do celular. A diferença é que, no mundo digital, muitos pais se sentem perdidos, porque os jovens dominam a tecnologia muito mais do que eles”.
FÉRIAS ESCOLARES E A IMPORTÂNCIA DA REDE DE APOIO. Com a chegada das férias, o desafio de supervisionar aumenta, já que os jovens passam mais tempo em casa e nas telas. “A escola promove socialização, mas as férias deixam os jovens mais isolados. É preciso buscar alternativas, como atividades criativas, leitura e interação com amigos e familiares. Se não houver supervisão, o tempo nas telas deve ser limitado”, aconselhou.
Débora também sugeriu a criação de redes de apoio entre pais. “Hoje, uma mãe que está trabalhando pode contar com outra que está mais disponível. Essa união pode ajudar a manter os jovens em atividades saudáveis durante as férias”.
BULLYING E CYBERBULLYING: FERIDAS QUE NÃO CICATRIZAM. A psicóloga destacou o impacto do cyberbullying, que amplifica os efeitos do bullying tradicional. “Antes, a violência na escola acabava ao chegar em casa. No mundo virtual, ela não tem fim. Grupos no WhatsApp ou perfis falsos no Instagram são usados para humilhar e excluir colegas, causando danos profundos à autoestima e à saúde mental”.
Ela ressaltou que, muitas vezes, os jovens têm medo de contar aos pais sobre essas situações, por receio de serem culpabilizados. “É por isso que o diálogo é essencial. A solução para os problemas digitais não é apenas digital, é principalmente analógica. Fortalecer a conexão entre pais e filhos é o que realmente pode fazer a diferença”.
COMUNIDADE GPS: CONEXÃO SEGURA. Débora apresentou a iniciativa GPS: Conexão Segura, que busca orientar pais e educadores sobre os desafios do mundo digital. “Nosso objetivo é guiar, proteger e salvar crianças e adolescentes. Não estamos aqui para culpar os pais, mas para oferecer suporte e enfrentar juntos esse desafio”.
A mensagem da especialista é clara. “Estamos lidando com uma geração que enfrenta uma crise sem precedentes. O cuidado com a saúde mental dos jovens é uma responsabilidade compartilhada entre família, escola e sociedade. Informação, supervisão e diálogo são as principais ferramentas para protegê-los”.